Sexta-feira, 08 de Agosto de 2008

Júlio Dinis (1839-1871), pseudónimo de Joaquim Guilherme Gomes Coelho. Esteve na Madeira três vezes entre 1869-1871.

 

Estátua da autoria de Ricardo Velosa (1996).

Casa onde morou Júlio Dinis.

 

 

Excerto de uma carta escrita a José Pedro da Costa Basto aquando da sua segunda visita.

 

 

 

Ó Funchal! Que tristes dramas se têm passado à luz do teu sol benéfico! Que lustrosos desenlaces de tantas histórias de paixões! Que de lágrimas ardentes caídas no teu solo sequioso, que se apresse a escondê-las discreto! E à sombra das tuas árvores quantas fontes escaldando de febre vergaram sob o peso da cruel melancolia!

Ilusões desvanecidas, esperanças desfolhadas, sonhos de amor, de glória, de felicidade, dos quais se desperta à beira do túmulo, tudo tens presenciado, ó humanitária cidade! E debaixo dos cedros e ciprestes dos teus cemitérios dormem o último sono muitos mártires, sem que as lágrimas dos que os amaram lhes caiam na campa como tributo.

Daí vem a simpatia e tristeza que inspiras. As tuas virtudes como irmã de caridade que consagra os dias ao cumprimento de uma missão cristianíssima, brilham entre cenas e espectáculos de desolação e de dor.

Este carácter da cidade avulta aos primeiros passos dados no interior dela. O viajante cruza-se a cada momento com certas figuras pálidas, emaciadas, pensativas, marchando lentamente, ou transportadas em redes, encontra-as nos assentos dos passeios em ociosa meditação, ou fitando melancolicamente as ondas que se sucedem na praia; são ingleses cadavéricos, alemães diáfanos, portugueses descarnados, brasileiros, norte-americanos, russos; são velhos, adultos, crianças, vaporosas belezas femininas de toda a parte do mundo, todos a convencer-nos de que estamos na cittá dolente, mas no pórtico desta não se lê gravado o dístico desesperador que o poeta inscreveu no da região das tormentas eternas. Pelo contrário, à entrada aqui revestem-se de esperança os próprios condenados.

Para que a Madeira nos sorria, para que nos apareça formosa como a descreve o poeta inglês e fragrante como uma verdadeira flor do Oceano, é necessário sair do recinto da cidade, procurar as freguesias rurais, subir as íngremes ladeiras que costeiam os picos e espraiar então a vista pelos formosíssimos vales que vão descobrindo o seio fecundidíssimo aos nossos olhos. (…)

 

Júlio Dinis

 

Funchal: Roteiro histórico turístico da cidade. Funchal: Câmara Municipal do Funchal, 2004. p.175-176

 



publicado por BMFunchal às 15:47
De
( )Anónimo- este blog não permite a publicação de comentários anónimos.
(moderado)
Ainda não tem um Blog no SAPO? Crie já um. É grátis.

Comentário

Máximo de 4300 caracteres



Copiar caracteres

 



O dono deste Blog optou por gravar os IPs de quem comenta os seus posts.

mais sobre mim
Agosto 2008
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2

3
4
5
6
7
8
9

10
11
12
14
15
16

17
18
19
20
21
22
23

24
25
26
28
29
30

31


links
pesquisar neste blog
 
subscrever feeds