CIDADE FUNCHAL
Minha noite assombro, meu dia acordado
gene do meu canto, voz inicial,
minha paz, meu grito, meu lar desejado
memória de funcho tornada Funchal.
Aroma distância, cor jacarandá
cidade da ilha, umbrais a sonhar.
Desejo em promessa que o amor me dá
na curva do abraço que a terra dá ao mar.
Não quero dizer-te
palavras à toa
tão loucas cantigas
que o canto me doa.
Mas quero que saibas
por me ouvir cantar
ó minha cidade,
que te sei amar!
Teu olhar-janela ao sol oferecido
miradouro d’ astros, pedra-coração.
Teu rosto-mosaico em verde embutido
-retrato que trago de recordação.
De noite improviso de estrelas caídas
de dia moldura de frias rotinas.
Com poeira d’ouro de esp´ranças moídas
recomponho a talha das tuas esquinas.
O pé dentro d’ água, o peito no vento,
um cesto de flores, um braço na serra…
Deus queira que os homens que amam a tempo
descubram teu corpo de sol e de terra!
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Ruas do Funchal
Assinatura do tempo
Rua de Santa Maria,
travessas desta cidade
do Descanso e da Saudade
Rua Nova da Alegria.
Ruas do Til e dos Louros
varadouros do olhar.
Rotas certas sem desvios
onde os olhos são navios
à espera de ir ter ao mar.
Rampas de fogo e arrojo
donde se lança o luar.
Ruas ao jeito
do meu peito
curvas, volúpias no espaço,
ruas sofridas
percorridas
ruas cansaço
do meu passo.
Ruas garridas
compridas
perfumadas
apertadas
na força do meu abraço.
Verdes quintas sonolentas
no silêncio dormem nuas.
Maravilhas, Jasmineiro,
Ilhéus…E em cada canteiro
respira o corpo das ruas.
Cheiro a lilás e orquídea
Caminho Velho da Ajuda.
Atrás dos muros antigos
os quintais são os abrigos
da cidade que não muda.
Arca-mistério da infância
que a memória não ajuda.
Ruas que eu sinto
labirinto
das minhas fugas inventadas
ruas airosas
luminosas
ruas ousadas
apressadas.
Ruas silentes
ausentes
ansiosas
desejosas
do meu amor demoradas.
LUCÍLIA, Irene – Ilha que é gente. Funchal: Secretaria Regional do Turismo e Cultura, 1986. P.26-27, 69.